segunda-feira, 24 de novembro de 2008

O Dia do Juízo

Fazia uma manhã quente, deliciosa, de um céu limpo, sem nuvens a pairar na liberdade azul do firmamento. Os alunos procediam como era comum em todos os dias, uns chegavam mais cedo à faculdade, deixavam seu material na carteira de sempre, ponto referente às suas respectivas panelinhas nascidas em função de afinidade ou porventura de algum interesse mais profundo, na maioria dos casos, de natureza sexual. Comportamento, que por lógica, era bem mascarado pela indumentária carnavalesca das sutilezas proporcionadas naturalmente pelo ambiente universitário. Todavia, como grande parte dos pensamentos paridos em vida, mal passavam de uma guerra-fria, noutras palavras, planos bobos e fúteis que jamais sairiam do papel.

Dos que chegavam mais tarde, tendo já começado a aula, pertenciam a outras castas mais ou menos interessantes, relativamente, quem quer que respire, ande e fale, não pode fugir de um destes dois rótulos. Acredito que o mais correto seria classificar os retardatários pelo título de Oc1 e Oc2, os quais, diga-se de passagem, não correspondem a nenhum elemento da Escala Periódica, significando antes de mais nada, o grupo dos “ocupados” e dos “ociosos”. Não, que não existissem tais primores da sociedade também entre os modelos de pontualidade, contudo, na face dos atrasados, pintava-se com maior força a marca de suas classificações. Se por um lado, os ocupados chegavam com olheiras de sono pelo trabalho que os consumia, os ociosos, carregavam semelhantes marcas, que até podiam ser confundidas com as de uma dia incessante de labuta, mas bastava um minuto de conversa para conhecer em que tipo de grupo cada um se adequava, no segundo, o diálogo forçosamente penderia para festas, namoros e afins, nada realmente sério.

Para lá e para cá caminhavam os rostos de simpáticos estranhos, nem todos chegavam a se conhecer e mesmo os que se conheciam dificilmente empregavam alguma profundidade a camaradagem cotidiana, no entanto, a convivência continua invocava um peculiar clima de cumplicidade presente em todos, sem distinção.

Na praça de alimentação do campus, representava-se o maior de todos os espetáculos, um misterioso teatro sem fingimentos, onde cada qual interpretava a si mesmo. Não, não falo de mentiras ou omissões de caráter, muito pelo contrário. A encenação limitava-se ao fato de estarem todos em um ambiente neutro, repleto da diversidade humana, circunstancialmente barrados pela incapacidade de relacionarem-se com qualquer grau de intimidade que fosse além de uma vaga indiscrição, o que, quando ocorria, não era de todo mal encarado, no máximo, caracterizava uma ridicularidade sem fim, poucos se atreviam a ultrapassar os limites.

O primeiro tempo, como é de costume, convidou o corpo discente às suas respectivas salas de aula através do bater de um sino cuja estridência excedia os gritos de judeus condenados à câmara de gás na Alemanha nazista. Como diz a Bíblia, os mais obedientes seguiam rumo ao seu destino, constando no trecho: “como ovelha muda foi levado ao matadouro...” outros, porém, preferiam manter-se sossegados e gastar mais alguns minutos entre conversas, salgados, aspirações românticas, cigarros, rara vez por estudo e etc, atentando para outro versículo que dizia: “muitos serão chamados, mas poucos serão escolhidos”.

Aula por aula, diariamente alcançavam o intervalo, todos os dias, sem arranhões, fisicamente falando. O mundo era complicado, infeliz e ordinário, principalmente em seus setores mais banais; ou dependendo do ponto de vista, simples, feliz e extraordinário, variava bastante de acordo com o lado da cama que despertava o indivíduo. Em todos os viventes, a percepção pós-sono cumpria rigorosamente o papel de definir o quão calamitoso ou generoso podia ser o universo em derredor.

Foi justamente naquele intervalo, por volta das nove e pouco, que teve início o frenesi que marcaria para sempre a história de suas vidas.

Primeiro, veio correndo pelo corredor o estudante que gritava em alto e bom som, jurando ter visto os ratos que brotavam dos esgotos, primeiramente aos milhares, depois aos milhões, bueiros e tampões de asfalto rachavam à sua passagem. Houve quem correu em pânico para constatar a veracidade da informação e registrar em foto um evento tão absurdo. Os mais céticos detiveram-se sentados sem dar crédito aquelas palavras proferidas com tamanha ênfase. “É uma brincadeira, só pode ser”, comentava-se. Mas então vieram as abelhas, vistas à princípio somente por uma aluna distraída que subia as escadas, ela despencou de lá e rolou, por pouco não se ferindo gravemente, podendo ainda se levantar e gritar “abelhas, socorro!” assustando ao passo que alertava quem passava por perto. Outros correram e se jogaram ao chão cobertos de picadas, envolvidos por nuvens tão densas das mais variadas espécies de insetos capazes de causar algum tipo de dor.

Daí por diante o caos foi instituído de maneira generalizada. Pois que uns corriam de cangurus carnívoros e outros de aranhas gigantes com rosto humano. Alguns sucumbiam aos seus perseguidores e imploravam por ajuda entre tormentos dilacerantes. Macacos alados rasgavam o teto e entravam aos montes a pairar pelas cabeças dos fugitivos.

Bastaram cinco minutos de terror para que o gênero humano sucumbisse ao mais baixo grau instintivo de sobrevivência, de modo que para salvarem-se das bestas e dos monstros peçonhentos, muitos colegas usavam outros como escudo, derrubavam quem quer que estivesse mais próximo, no intuito de retardar o avanço de um predador em potencial, usando como artifício, o sacrifício de um semelhante.

O chão abriu-se em muitos lugares revelando abismos sem fundo, onde de quando em quando, precipitavam-se os que perdiam a esperança de encontrar a morte nos braços de uma velhice serena. Tantos eram os que ajoelhados puseram-se a rezar aguardando expirar pelas mandíbulas, garras ou ferrões das aterradoras criaturas, que ficou óbvio o quanto valia nascer em um pais culturalmente cristão, sendo estes estóicos abnegados, os primeiros a continuarem berrando após a mórbida precisão com um a um, todos iam sendo esquartejados, e mesmo aos pedaços, ainda que partidos ao meio, esmagados até o achatamento, perpassados por garras do tamanho de tacos de sinuca, e outras tantas atrocidades similares, não se via alguém morrer de fato. Apenas continuavam gritando e gritando e gritando.

Foi quando ouviu-se o ressoar de uma trombeta divinal, e os que continuavam de pé, inclusive os monstros, curvaram mediante a visão que lhes sobreveio. Joelho após joelho dobrou-se à passagem de três estranhos personagens que, revestidos de glória, entraram na faculdade pela porta da frente. Um deles era Jesus Cristo, bem caracterizado com sua barba longa, seu manto branco, olhos azuis e pele caucasiana, em sua versão mais Hollywoodiana de ser, seguido pela Virgem Maria, envolta com seu famoso manto azul, coroada para a assunção; o anjo segurando a trombeta, ostentava asas que lembravam vagamente um desfile da vitoria secret’s, caminharam os três pelo corredor e atravessaram os demais, todos sentiram-se inebriados pelo privilégio de presenciar tamanha graça, o fim era chegado, todos seriam julgados com igualdade e justiça. “Deus é socialista”, disse um certo professor prostrando-se à passagem das divinas personagens.

Eles caminharam por todo o campus sem serem incomodados, trazendo paz e sossego, fazendo sumir os demônios e deixando como rastro, um delicioso odor de rosas. Finalmente, sumiram no almoxarifado.

Demorou pouco para o frenesi fosse restituído.

Dentro do almoxarifado, os três alunos afrouxaram as vestes que os sufocavam, afinal, fazia um calor escaldante. Aquele a que se fantasiara de Cristo tomou da mão do que se aliviava das asas de anjo, um gravador, recostou-se de costas entre os braços de sua namorada, a virgem santa, apertou REC e começou a falar:

– A experiência correu como o esperado, uma vez que caem vítimas de um entorpecimento em massa, os seres humanos tendem ao terror e à selvageria coletiva. Os pavores de um, ao serem verbalizados, são transmitidos para o outro e traduzidos em forma de imagens que elevam seu grau de distorção à medida que passam de ouvido para ouvido. Uma espécie diabólica de telefone sem fio. Tal histeria frenética pode ser aplacada através da influência externa de um símbolo que cause sensação oposta, algo referente à segurança, à paz, enfim, ao “bem” maniqueísta, ou seja, qualquer figura convencional eleita que apresente significado sacro de acordo com a cultura vigente. – tendo terminado sua parte, Jesus entregou o gravador ao anjo e este continuou.

– A solução utilizada de seis litros de chá de zabumba em contato com o bebedouro pode atingir entre o inicio do primeiro tempo e o intervalo das aulas, cerca de sessenta e cinco por cento dos discentes. Especulamos que a não adulteração dos caldos, sulcos e cafés da cantina nos teria atrapalhado no objetivo de alcançar a marca extra de oitenta e nove por cento que constitui a estatísticas finais. Contraponto que reduziria o número de indivíduos afetados, colocando a perder a eficácia do experimento em sua totalidade. Em termos menos formais, um louco é apenas um louco; dois podem não passar de drogados; três, provavelmente são um bando de afrescalhados; de cinco à dez, temos um surto de histeria mínimo; de onze à cinqüenta, Mira & Lopes sem muros; de cinqüenta e um em diante, está instaurado nosso pequeno apocalipse universitário. – Imediatamente após ter encerrado seu comentário, o anjo repassou o gravador para as mãos de Maria que fechou com as últimas considerações.

– Concluímos que com algum esforço haja a possibilidade não remota de reprodução da mesma experiência em escala municipal com larga margem de sucesso. Lógico que haveria a necessidade de envolver um número muito maior de cientistas cuja genialidade mórbida excedesse o amadorismo, isso sem mencionar a cavalar propina necessária para mover os devidos encarregados responsáveis pela supervisão dos principais veículos de distribuição de água locais. Ainda estamos estudando a exata quantidade ciclópica de elixir da fantasia que atenda a demanda de tamanha empreitada, contudo, é unânime de nossa parte, aliais, é um fato experimentado por todos nós, que apenas um gole do chá utilizado induza a um estado de percepção alterada durante horas e horas que chegariam a ser bastante divertidas se por acaso, no interior de cada ser humano não houvesse tanto medo e desespero esperando a menor brecha torturar quem quer os deixe sair. Fim da experiência. Agora, que tal uma pizza?

Autor: Eugênio Gabriel Asa

QUEM SOU EU?

sou uma pessoa que sonha muito e que por causa desses sonhos se frusta muito pois a vida só serve pra isso pra nos trazer problemas frustações, dor, derrota, desespero e duvida a repeito de tudo a nossa volta
a minha vida está um completo caos pois
não sei mais o que quero
não sei do meu futuro
não sei que rumo eu devo seguir da minha vida
não sei o que felicidade
não sei se sou realmente feliz
não sei o que é amor
não sei se já amei alguém um dia
não sei quem sou
a unica coisa que sei é que nada sei
antes isso me impolgava para tentar resolver todos esses questionamentos, mais hoje só me causa dor e aflição e confusão em relação aos meus sentimentos que não conseguem se alinhar em um unico objetivo
antes eu achava que isso era saber viver, era saber que não sabia de nada mas isso não é vida isso é uma batalha diaria pela qual eu não sei se estou preparada para enfrentar
enfim essa sou eu
um posso de indecisão
um posso de incerteza
um posso de duvidas
pois afinal pra que tudo isso tudo que a gente faz serve pra que?
pra mostrar pra alguem?
de que me adianta falar quem eu sou na minha pura duvida se cada um vai pensar uma coisa diferente a meu respeito?
então isso não passa de pula tolice humana em querer parecer algo pros outros quando que na verdade elas só precisam saber quem elas são pra elas mesmas...

terça-feira, 18 de novembro de 2008

ADH



Este vídeo representa de maneira distorcida um momento decisivo para a história humana, abordando a apartir de uma perspectiva atraente porém não convencional. Trata-se do nascimento de um monstro, onde a beleza de sua gênesis ilude o espectador, levando-o a pensar na possibilidade da personagem abordada ter trilhado caminhos menos repulsivos.

sexta-feira, 14 de novembro de 2008

Análise semiótica do "Baton Garoto"


Olhar Contemplativo: qualidade geral.

É chocolate; é de comer; cor vermelho metálico vivo. A coisa balança feito pêndulo enquanto uma criança repete insistentemente "Compre Baton, Compre Baton..."

Olhar Observacional: concretização da qualidade.

É gostoso; engorda; é embalado com a cor da paixão; está do outro lado da tela e eu não posso comer, preciso comprar; a voz do moleque dá um troço nervoso.

Olhar de Generalização: generalização da qualidade.

Vale a pena pelo deleite degustativo papilar, contudo a protuberância estomacal resultante causa uma série de arrependimentos estéticos. Toda criança chata come Baton; sempre vai haver uma nova criatura comprando Baton e uma nova criança chata repetindo incessantemente: "Compre Baton, Compre Baton..."

quarta-feira, 12 de novembro de 2008

E falando em Natal...




Para falar do Natal, não existem segredos, basta olhar para dentro de nós mesmos. No Natal, estamos propícios a amar mais, ter mais carinhos, ser mais solidários. É o que nos envolve, este Espírito Natalino. Mas vejamos o mundo num foco mais nítido - isso ocorre somente nesta época do ano. O nascimento de Jesus Cristo tem o poder de causar essa transformação em nós. Época em que surgem milhares de voluntários, pessoas fazendo seus donativos, pessoas se abraçando, trocando calor humano com seus entes queridos. Eu vejo muita gente se engrandecer diante desse espírito, mas eu somente tenho a perguntar: - Por que?

Porque essas coisas só ocorrem no mês de Dezembro? Será um mês sagrado? Será que é tão difícil sermos assim o ano inteiro? Todos os dias de nossas vidas, nós devemos amar uns aos outros, respeitar uns aos outros, sermos solidários. O mundo não funciona somente no Natal, as crianças não necessitam de carinho, apenas no Natal, os necessitados, não passam fome, não sentem frio apenas no Natal. Eu quero olhar o Mundo e poder ver isso todos os dias.

Se Deus me concedesse um desejo, desejaria que nascesse um Jesus Cristo todos os dias.

JÁ ESTAMOS NO NATAL?



Falta mais de um mês para o natal e o clima natalino já está no ar, principalmente no meio comercial. O modo como o mercado trata as datas comemorativas em geral é um tanto manipulador, especialmente as comemorações de fim de ano que é a época de dar e receber presentes, e são estes presentes (bens e serviços) o maior interesse dos empresários e comerciantes; ou alguém pensou que eles só querem que ninguém esqueça o que se celebra no dia 25 de dezembro? Na verdade nem se sabe mais o significado do natal. O interesse em lucrar sempre mais e mais transformou as festas natalinas e as outras comemorações ao longo do ano em grandes jogadas de marketing, uma excelente forma de movimentar o mercado para atender as expectativas econômicas dos comerciantes. Toda a família vai aos centros comerciais para ver o papai Noel e comprar "lembrancinhas".

Será que os shoppings esperam que as pessoas comprem presentes agora, muito antecipadamente, e comprem novamente nas vésperas do natal?! Então por que todo esse alvoroço, se quem pretende comprar presentes nessa data comprará de qualquer forma, e geralmente o mais perto possível do dia 25? Talvez até exista pessoas que comprem e guardem os presentes por vários dias até a “data certa de entregar”.

Mas a questão vai além. E quanto ao simbolismo e tudo em que esta comemoração foi fundamentado? Certamente não foi em ideais capitalistas. Toda essa campanha com fins lucrativos já começa pela imagem do papai Noel, difundida de forma massiva pela coca-cola e que virou o grande ícone do natal, tirando toda a glória do verdadeiro dono da festa: Jesus, do qual celebramos o nascimento; mas isso já ficou para trás. Agora em meados de dezembro é tempo de distribuir presentes para todo mundo sem motivo consistente, apenas porque é NATAL. Então, Feliz Natal! E Feliz Páscoa também, afinal daqui a pouco já é tempo de comprar ovos de chocolate e dar para os amigos e familiares, porque, enfim, a Páscoa é em comemoração a... o que é mesmo que comemoramos???

terça-feira, 11 de novembro de 2008

Leitura...uma droga!

"Aquele que tem por vício a leitura, droga alucinógena das mais leves, acabará cada vez mais dependente dela. E o pior, passará para drogas mais pesadas, como a escrita. Nesta fase crítica, o leitor, agora escritor, tende a fugir regularmente da realidade e ter devaneios de que, assim como Deus, é criador de Universos inteiros."

Por isso se viciem...em leitura, apenas!

Semiótica na Pop Art



Vídeo feito na exposição de arte pop no Centro Dragão do Mar de Arte e Cultura em Fortaleza-CE.

terça-feira, 4 de novembro de 2008

ELÃ PECÚLIO - O detetive que enxergava a alma.

Primeiro Caso -
Torre de Babel (PARTE IV)

A esta altura, a Rua Pero Vaz de Caminha em peso via a ambulância ir embora levando consigo a “adorável” menina, a quem muitos dos mais velhos, conheciam desde o nascimento.

Daquele dia em diante, coisas horrorosas seriam ditas sobre a moça, os boatos mais comuns envolveriam uso de drogas; comentar-se-ia acerca de supostos abusos sexuais; possíveis pactos com o diabo; TPM estilo “O Exorcista”; experimentos científicos que levariam-na a transformar-se num monstro verde e anabolizado com o intelecto de uma ervilha cujo prazo excedera a validade; conspirações alienígenas ligadas ao caso Varginha, et cetera e afins. Fatalmente, a verdade seria única coisa de que ninguém suspeitaria, e no entanto, Elã tinha como descobri-la. Sim, ele o faria, estava disposto salvar Alice de seu inferno pessoal, ainda que para isso, fosse preciso precipitar-se no mesmo abismo em que ela estava, sozinha na vastidão tempestuosa de sua alma.

“Já é hora”, murmurou o moço com seus botões, observando o veículo sumir à distância numa curva qualquer, levando consigo Alice, um mistério a ser resolvido e o ensurdecedor barulho da sirene, depois, o único ruído que restara, provinha dos grilos e dos prantos de uma mãe em desespero, nenhum visinho ousou dirigir-lhe a palavra. “Já é hora... Hora de despertar para o meu destino e assim fazer do mundo um lugar melhor. Quer pelo vôo de anjo ou no rastejar de um demônio, decifrarei este enigma, ou não me chamo Elã Pecúlio”.

ELÃ PECÚLIO - O detetive que enxergava a alma.

Primeiro Caso -
Torre de Babel (PARTE III)

De repente, a mãe de Alice que desejando não assistir o prelúdio do encarceramento de sua filha única numa instituição cujo estigma invocava emoções de vergonha e sofrimento, nem tanto para o doente, mas para quem tem vínculos com este, saiu para o lado de fora desacompanhada do pai que ainda não tornara do golpe recebido da filha enquanto tentava explica o motivo de ter ligado para um manicômio. A senhora, chamada Berenice, emudecida balbuciava fragmentos de frases ininteligíveis em direção à filha que estava de costas, Alice não ouvia nada, vagava perdida em algum lugar dentro de si, a mãe, por sua vez, não conseguia falar mais alto, posto que embora quisesse, tinha muito medo de que a filha escutasse, coisa que inevitavelmente ocasionaria numa nova troca de olhares com aquele semblante transtornado que ela jamais vira num rosto humano, que dirá, em sua prole.

Sorrateiramente, os três encarregados de subjugar a moça cercaram-na de modo que ela não pudesse dar conta dos três ao mesmo tempo. Destarte, o primeiro que tocou o chão foi o motorista, vítima de um sopapo tão hediondo que lhe havia rasgado da cartilagem nasal deixando exposta a estrutura interna do nariz, amiúde, o “pau da venta”. O segundo teve pior sorte, devido à cognição sonolenta dos que despertam pela metade, aquele há um minuto jazia inconsciente, retornara a mesma situação, com o agravante de que agora, do olho esquerdo entreaberto descia misturada numa lágrima, uma fina gota vermelha, oriunda dos vasos sanguíneos despedaçados pelo punho direito da infeliz. Aproveitando-se da sorte de ter sido deixado por último, e lógico, da injeção de efeito paralisante muscular que escondera nas costas da mão, o terceiro conseguiu rapidamente acertar a nádega da garota que caiu imediatamente debatendo-se em convulsões. Demorou pelo menos uns quinze minutos até que o motorista despertasse gritando de dor, quanto ao outro enfermeiro, não esperaram que este abrisse os olhos, puseram ambos, ele e a menina, em macas, e disparam feito bala para o manicômio.